sexta-feira, 21 de junho de 2013

Gotículas da Graça - O Reino de Deus e as Manifestações Públicas

" Pai nosso que estás nos céus, ... venha o teu Reino..." São Mateus

Diante dos muitos conflitos que envolviam a cena política nacional no início da década de 1960, perguntaram ao então governador do estado de Minas Gerais, José Magalhães Pinto: " Governador, onde Minas fica, diante desse complexo cenário político?" Mineiramente, o governador respondeu numa única tirada: " Minas! Minas fica onde sempre esteve"
Diante dessas tantas lindas, expressivas e emocionantes manifestações, ouço um som insistente, como vozes em surto psicótico: " pastor onde a igreja fica diante desse complexo cenário político? " Parodiando o mineirismo de Magalhães Pinto, digo: " A igreja! A igreja fica onde sempre esteve "
Essa crise sobre o posicionamento da igreja frente ao cenário hodierno que envolve o povaréu, é desde sempre uma constante dor na consciência evangélica, facilmente mobilizada pela passionalidade de uma agenda moral, em que temas sociais, tais como: educação, pleno emprego, moradia, corrupção, saúde geral e de qualidade, são banalizados e desmerecidos.
Os bons judeus achavam que o Reino de Deus viria por si mesmo, pois desde os tempo dos velhos profetas essa era a dominância na consciência religiosa do povo de Deus, eles entendiam que aquela raça de gente exploradora e aviltante, que solapava a sua juventude e sequestravam os seus sonhos haveriam de um dia se encontrar com a Ira de Deus que lhes daria o que mereciam, e para tanto deveriam se manter fiéis aos seus designíos, pois o Justo Juiz haveria de livrá-los dos contemporâneos sofrimentos.
" O Dia do Senhor Virá! " Era o som que eclodia do fundo da alma nacional da maioria dos religiosos, bem representada nos tempo de Jesus pelos fariseus.
Essa pureza, em certa medida é abalada a partir de um personagem no primeiro século antes da era cristã, chamado João Hircano, que não dando "bola" para a visão profética reinante, se auto intitula rei e sumo sacerdote de Israel e dizima seus naturais opositores. Hircano planta a semente do pensamento defendido pelos zelotes: O Reino de Deus não virá por si mesmo, sem que haja uma força externa que sirva de braço concreto para a construção da dignidade sonhada ao longo dos séculos pelos profetas.
Entretanto, Jesus apresenta uma terceira via sobre o Reino de Deus, por vezes parece se alinhar com os fariseus que relutavam em confrontar o sistema político vigente por acreditarem que o caminho da dignidade e liberdade deveriam ser adquiridos processualmente, como uma gangorra, ora pouco mais agudo, ora mais ameno.
O Santo de Deus reluta em ser visto como um revolucionário, um líder político, um salvador da pátria, afasta-se desse ideário coletivo: " o meu reino não é deste mundo "; " dai a César o que é de Cézar " " os homens se assenhoreiam sobre os outros, mas com vocês não será assim, antes vocês serão conhecidos quando se amarem uns aos outros " são citações que nos faz acreditar que o Senhor da Vida está concordante com os fariseus.
Opostamente Jesus lança mão de exemplos e atitudes que dão água na boca dos zelotes, aqueles que defendiam a conquista da liberdade pelo braço forte. Por vezes o Mestre dá pitadas de ensinos e exemplos que fazem os aguerridos libertários suspirarem de satisfação e admiração ao filho do  socialmente humilhado José, um simples pedreiro carpinteiro.
Ao distribuir pancadas nos ambulantes no episódio do santuário, quando disse: " o zelo pela minha casa me consome " Ali se vê um radical zelote, amante da pureza e pronto para matar e morrer por ela. Também quando constantemente confronta os fariseus lhes oferecendo habitualmente duras palavras de condenação que só eram ditas aos traidores do povo, também aí se parece Jesus com um vigoroso zelote.
Entretanto, na verdade, o que Jesus em suas andanças evangélicas mostra é uma diferenciada visão do Reino de Deus, pois podemos ver que ora ele aponta para um agir divino e soberano sem o qual nos será impossível toda força, confrontação e luta armada, pois somente ao Rei dos Reis pertence o tempo e todos os reinos.
Outrossim, o Caminho, a verdade e a Vida também nos ajuda a entender e compreender que o Reino virá de igual forma por esforço, dedicação e entrega, e seu próprio exemplo é a maior ilustração, pois em meio a miséria humana não cruza os braços, mas, bem ao contrário, Ele se coloca na estrada e trabalha arduamente na construção de uma grande rede de amigos discípulos, ao lado de quem inicia a construção do sonho havido há séculos, chamado: Reino de Deus.
Onde fica a igreja? A igreja fica onde sempre esteve.
A real igreja de Jesus Cristo sempre estará ao lado do povo, pois para ele coexiste. Estará em meio ao povo, pois é feita de sua substância. Estará à frente do povo, pois é força profética a apontar o caminho de Deus em direção à Vida, em direção à Ele.

sexta-feira, 14 de junho de 2013

Gotículas da Graça - Tolerando a intolerância


 Cresci ao lado de multiplicidade de religiões. Não tive, como meus filhos, o doce privilégio de ser abençoado com uma bela e fervorosa oração logo nas primeiras horas de vida, mas bem ao contrário, sou filho de um lar tão sincrético que somente em uma casa bailavam ao menos cinco credos: catolicismo, umbandismo, espiritismo, marxismo e ceticismo.
Sou calvinista antes mesmo de saber, pois não há outra explicação que não seja a eleição divina para dar conta de minha conversão e chamado ao ministério da palavra, em meio a tal babel cultural e religiosa.
Sou muito grato a Deus por fazer parte da Comissão Contra a Intolerância religiosa - CCIR, pois tenho a oportunidade de vivenciar junto a pessoas tão diferentes de mim e de credos tão antagônicos, um pouco da graça de Deus que está em busca de todos e de qualquer um, uma vez revelada em Cristo Jesus: o Caminho, a Verdade e a Vida. 
É compreensível o reducionismo que sofro ao ser acusado de alinhamento com os religiosos de matriz africana, pois fomos habituados, educados e formados para rejeitá-los, discriminá-los e mantê-los afastados, de tal forma que se alguém evangélico nutri relacionamento com esses SERES HUMANOS, alguma coisa está errada com esse tal religioso.
Gostaria que fosse mentira, o que vou narrar, mas não é.
Presenciei um pastor, de não pouco destaque entre os evangélicos do Rio de Janeiro,  que se recusou a cumprimentar uma religiosa da umbanda, que tomou assento conosco em uma mesa de debate. O inquiri de seu procedimento, diante do que, disse sem o mínimo constrangimento: " não toco o corpo de alguém que serve o diabo".
Meus filhos até o final do primeiro grau estudaram em escola de orientação romana, e mesmo que, na condição de evangélico tivesse o direito de dispensá-los das aulas de religião, eles frequentaram todos os anos como ocorria com os alunos católicos, pois achava fundamental que aprendessem, desde criança, ao menos, respeitarem e compreenderem a importância da religião de seu próximo, ainda que fossem discordantes.
Recentemente missionários brasileiros foram caluniados, injuriados e presos no Senegal e houve competente ação da Igreja Presbiteriana junto ao governo senegalês que, após um longo período, conseguiu a soltura dos missionários.
O curioso é que nenhum de nós teve dúvidas em compreender que a intolerância é fruto de uma sociedade em regime de exceção, alimentada pela ignorância e fundamentalismo, e que a liberdade religiosa serve, infelizmente a proliferação de credos com os quais discordamos, mas também dá ao evangelho a liberdade para ser semeado a tempo e hora, permitindo que ele frutifique em progressão geométrica.
Não há outro jeito, devemos tolerar a intolerância, mas bom seria que houvesse respeito e compreensão, ainda que continuássemos a pregar nosso Cristo, que é o único caminho para se chegar ao Pai.